Introdução: Entendendo o Mutirão Carcerário
O mutirão carcerário é um processo organizado pelo Poder Judiciário com o objetivo de reavaliar situações de prisão provisória, definitiva, medidas de segurança e aperfeiçoar rotinas cartorárias, a fim de garantir o cumprimento da legislação e precedentes vinculantes. Está fundamentado em princípios legais, constitucionais e normativos que orientam a duração razoável do processo e o caráter excepcional da prisão antes da condenação.
A atual ação liderada pelo CNJ utiliza método mais ágil e colaborativo, que busca informações no sistema SEEU como etapa anterior de seleção dos processos que serão revisados, além disso é marcada por uma intensa preocupação com o devido encaminhamento da pessoa após a saída, resultando em maior equilíbrio aos sistemas prisionais estaduais e qualificação da soltura nas unidades prisionais.
A História e o Impacto do Mutirão Carcerário
O mutirão carcerário começou em 2008, e ao longo dos anos, juízes têm viajado pelo Brasil para inspecionar unidades carcerárias e garantir o cumprimento da Lei de Execuções Penais. Seus resultados são impressionantes – mais de 400 mil processos analisados, 80 mil direitos concedidos, e pelo menos 45 mil pessoas foram liberadas após cumprir suas penas.
Em 2019, iniciou-se uma revisão do modelo de mutirão, pois a partir do processo de nacionalização do SEEU – Sistema Eletrônico de Execução Unificado – ferramenta tecnológica do CNJ que unifica e integra mais de 1,5 milhões de processos de execução penal no país -, tornou-se possível o tratamento dos dados, o que contribui mais agilidade na seleção e análise de processos.
Mutirão Carcerário de 2023: Como Funcionará
O mutirão carcerário de 2023 seguirá diretrizes e procedimentos estabelecidos pela Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para ocorrer em todo o país entre os dias 24 de julho e 25 de agosto e abranger mais de 100 mil processos.
Os mutirões ocorrerão em todos os estados simultaneamente, com uma estratégia conjunta entre o CNJ e os Tribunais de Justiça, em coordenação com outros órgãos do sistema de justiça, tais como Defensoria Pública, OAB, Ministério Público, Departamentos Penitenciários, Patronatos, Escritórios Sociais, etc.
Quais casos terão a prisão reavaliada?
De acordo com o Art. 2º da Portaria n. 170/2023 do CNJ, deverão ser reavaliadas de ofício, pelos juízes naturais dos casos, as prisões nos processos de conhecimento e de execução penal que contemplem as seguintes hipóteses:
I – prisões preventivas com duração maior do que 1 (um) ano;
II – gestantes, mães e mulheres responsáveis por crianças e pessoas com deficiência presas cautelarmente;
III – pessoas em cumprimento de pena em regime prisional mais gravoso do que o fixado na decisão condenatória;
IV – pessoas cumprindo pena em regime diverso do aberto, condenadas pela prática de tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006).
Revisão da Situação Jurídica pelos juízes criminais:
Após a identificação de todos os processos que efetivamente se enquadrem em alguma das hipóteses tratadas, O CNJ orienta que juízo natural do processo criminal proceda à:
- revisão da necessidade, adequação e proporcionalidade da manutenção da prisão processual, considerando-se o tempo de custódia provisória já decorrido, a fase em que se encontra o processo e o quantum de pena em perspectiva em caso de condenação;
- revisão da prisão cautelar à luz das ordens de habeas corpus concedidas pela 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal nos HCs no 143.641 e 165.704, detalhadas no art. 4º, § 6º da Resolução CNJ nº 369/2021.
Revisão da Situação Jurídica pelos juízes da execução penal:
Aos juízes responsáveis pela execução da pena, o CNJ recomenda que a reavaliação da prisão ocorra:
- em caso de ausência de vaga no regime ao qual a pessoa foi condenada, aplicação da Súmula Vinculante 56 do STF: “[…] Havendo déficit de vagas, deverão ser determinados: (i) a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas; (ii) a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas; (iii) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progride ao regime aberto. Até que sejam estruturadas as medidas alternativas propostas, poderá ser deferida a prisão domiciliar ao sentenciado.”
- colocação em regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos das pessoas em cumprimento de pena pela prática exclusiva de tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06), que estejam em regime fechado ou semiaberto, quando ausentes vetores negativos na primeira fase da dosimetria (art. 59 do Código Penal), observados os requisitos do art. 33, § 2º, alínea c* e do art. 44**, ambos do Código Penal. (* “O condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.” ** “Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando.[..]”)
Objetivos do mutirão
O mutirão carcerário de 2023 tem como objetivos:
1. Garantir a Observância Legal: garantir o cumprimento da legislação, dos precedentes do Supremo Tribunal Federal e de resoluções do CNJ.
2. Desafogar os Sistemas Prisionais: ao revisar prisões e medidas de segurança, o mutirão busca reduzir a superlotação carcerária e corrigir injustiças.
3. Promover Alternativas Penais: a promoção de alternativas à privação de liberdade e a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão também são focos do mutirão.
4. Respeitar Direitos Fundamentais: a iniciativa busca respeitar e proteger direitos fundamentais, como o direito à duração razoável do processo e a proibição de excesso ou desvio de execução.
5. Favorecer a Saída Digna do Cárcere: coordenando com várias instituições, o mutirão também visa garantir a reinserção social da pessoa e o encaminhamento às políticas públicas de saúde e assistência social quando necessário.
Como se pode notar, o mutirão carcerário de 2023 é uma resposta abrangente e articulada às complexidades e desafios do sistema prisional brasileiro, já declarado em Estado de Coisas Inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, e visa trazer maior eficiência, justiça e humanização no tratamento das questões penais no país.
Para saber a quem se destina o mutirão carcerário de 2023 clique aqui.